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A Reforma Trabalhista e a Proteção das Trabalhadoras: Desafios e Contradições da CLT

  • Foto do escritor: SERGIO DA SILVA EGITO
    SERGIO DA SILVA EGITO
  • 22 de mai. de 2024
  • 4 min de leitura

A reforma trabalhista trouxe desafios jurídicos que ainda precisam ser resolvidos. A Lei 5.452, de 1º de maio de 1943, foi considerada obsoleta, o que justificou a necessidade de uma reforma. De fato, uma reforma era necessária; entretanto, jamais poderíamos imaginar que essa necessidade resultaria em mudanças tão prejudiciais aos trabalhadores.

Enumerar todos os desmazelos cometidos contra os direitos dos trabalhadores pela reforma de 2017 tornaria este artigo enfadonho e repetitivo. Grandes juristas já expuseram suas críticas de forma contundente.

Vamos, então, refletir sobre duas perguntas simples: quantas horas de trabalho uma mulher realiza diariamente? As tarefas domésticas acumuladas com a carreira profissional não resultam em uma carga horária exacerbada? Observemos o exemplo de uma mãe e esposa que necessita trabalhar para ajudar no orçamento doméstico; essa é a realidade da grande maioria das brasileiras.

As mulheres já provaram sua capacidade no mercado de trabalho. No entanto, justamente por trabalharem mais horas que os homens, merecem uma atenção especial do legislador no que tange à proteção no mercado de trabalho. Não porque são inferiores aos homens, mas porque seu labor se estende além das suas profissões.

O artigo 386 da CLT expõe claramente a intenção do legislador de resguardar a saúde da trabalhadora, considerando suas condições sociais e familiares. Quando falamos de saúde, referimo-nos tanto à saúde física quanto à mental.

Após uma jornada exaustiva de trabalho e enfrentar longas horas em transportes coletivos precários, a maioria das trabalhadoras ainda precisa cuidar dos afazeres domésticos. Vejamos o que diz o artigo 386 da CLT:

Art. 386 - Havendo trabalho aos domingos, será organizada uma escala de revezamento quinzenal, que favoreça o repouso dominical.

Esse artigo determina que a trabalhadora folgue dois domingos por mês, visando proteger sua saúde. É compreensível que empresas do comércio precisem funcionar aos domingos, considerando o ritmo capitalista exacerbado da sociedade. No entanto, os trabalhadores possuem limitações físicas e psicológicas, e os períodos de descanso são essenciais.

A Constituição de 1988, no artigo 7º, XV, assegura um descanso semanal remunerado ao trabalhador preferencialmente aos domingos. De forma semelhante, o artigo 67 da CLT garante aos trabalhadores um descanso de 24 horas consecutivas, coincidindo com o domingo no todo ou em parte. Resta, então, estabelecer o que é "conveniência pública" e "necessidade imperiosa".

No contexto do artigo 67 da CLT, "conveniência pública" refere-se às situações em que o funcionamento de determinados serviços é essencial para a sociedade, como saúde, segurança pública e transporte coletivo. "Necessidade imperiosa" descreve circunstâncias excepcionais em que a continuidade do trabalho é imprescindível para evitar danos ou prejuízos significativos, seja à própria empresa ou à coletividade.

Os termos acima justificam a flexibilização do descanso semanal aos domingos para garantir a continuidade de serviços essenciais. Nesse contexto, enquadra-se o artigo 6º da Lei 10.101/2000:

Art. 6º - Fica autorizado o trabalho aos domingos nas atividades do comércio em geral, observada a legislação municipal, nos termos do inciso I do caput do art. 30 da Constituição Federal.

Não parece irônico que alguns trabalhadores tenham que trabalhar para que outros descansem? Mas essa é a realidade da máquina capitalista. Não sou contra o capitalismo; sou contra a ideia de que pessoas se matem de tanto trabalhar apenas para manter as regalias de poucos que não consideram os limites físicos e psicológicos dos trabalhadores. O trabalho deve ser em prol do homem, e não o contrário. Contudo, não sou ingênuo; isso não vai mudar. Sempre haverá alguém que manda e alguém que obedece.

Dito isso, surpreende que um sindicato tenha conseguido uma decisão tão favorável às trabalhadoras nos tribunais trabalhistas de primeira e segunda instâncias de Santa Catarina, culminando em uma decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal (STF). Veja os processos RR-619-11.2017.5.12.0054 (TST) e RE 1403904 (STF).

No recurso extraordinário, a recorrente, uma grande rede de lojas, alegava a inconstitucionalidade do artigo 386 da CLT, justificando que a escala diferenciada de repouso semanal para as trabalhadoras contrariava o princípio da igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres. Esse argumento não foi suficiente para alterar a decisão.

Uma vaga de emprego para um empresário representa várias despesas, incluindo obrigações tributárias. A carga tributária brasileira é uma das mais altas do mundo capitalista. Contudo, uma vaga de emprego para um trabalhador representa a proteção de pelo menos duas ou mais vidas. Ambos são importantes para a manutenção da dignidade humana. O dilema está estabelecido, mas isso é tema para outro artigo.

Minha indignação refere-se ao poder concedido aos sindicatos pela Lei 13.467/2017 de legislar sobre todas as demais leis criadas, discutidas, corrigidas e votadas nas casas legislativas. Refiro-me ao artigo 611-A da CLT, que confere superpoderes aos sindicatos para legislar sobre a jornada laboral dos trabalhadores. Por exemplo, a justa decisão do STF no Recurso Extraordinário nº 1403904, que manteve a constitucionalidade do artigo 386 da CLT, pode ser anulada por uma simples cláusula sindical contrária. Dessa forma, todos os trabalhadores estão à mercê dos sindicatos.

Entendo a importância dos sindicatos, mas considero temerário que o artigo 611-A permaneça constitucional, mesmo sob a tutela decisória do STF ao julgar o Tema 1046 do Ementário de Repercussão Geral. Assim decidiu a Corte Suprema:

"São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis." (Migalhas).

 

Não parece contraditório e inseguro que um mesmo tribunal profira decisões contraditórias sobre o mesmo tema?

Assim, as mulheres podem ser obrigadas a trabalhar três domingos por mês e folgar apenas um, se houver essa previsão na norma sindical da categoria. Ah, Brasil! Até quando?

 

Dr. Sérgio Egito

Advogado Trabalhista

 
 

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